segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

IRIS

iris a flor nasce e se esvai num dia
o eterno rompe o tempo e então se ausenta
inesperadamente se apresenta
quando menos seu vir se pressentia

iris a flor o eterno que se inventa
irrompe nos limites me extasia
a alma quando a vejo (principia
e termina tão breve)  se contenta

ciclicamente a flor que não havia
surge (me encanta)  bela me acalenta
do eterno (em tempo exíguo me alimenta)
que de sua beleza se irradia

iris a flor quando ela me surgia
flor nascida mulher (tranquila e lenta
foi sua chegada) logo ela se assenta
bela em meu coração que da alegria
do eterno prova (do que não sabia)
e alarga o dia e o dia me apascenta





terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

INSTANTE

o instante me escapa como a água me escapa
entre os dedos das mãos se vou aprisioná-la
se quero mesmo a água é deixá-la sem tê-la
se quero mesmo o instante é caminhar com ele
por todas as veredas: é passearmos juntos

e Deus que habita o instante me convida a senti-Lo
nas coisas mais pequenas entre as dobras do tempo
entregar-me sem medos: não querer mensurá-Lo
e nunca pensar n"Ele (tão-somente vivê-Lo)

viver Deus no instante a cada instante novo
nas mais pequenas coisas que há no meu caminho
abraçá-Lo e beijá-Lo na pessoa que chega
vê-Lo também na dor que chega
abraçá-Lo e beijá-Lo nessa dor que chega
receber Seus afagos de Mãe
na pessoa na dor no pó da estrada

o instante me baste como me basta Deus
o instante me baste como me basta Deus

FOME DIVINA

sentado no banco azul da parada dos ônibus
Deus com os pés inchados o corpo sem banho os olhos sem esperança
me sento ao lado de Deus: ouço sua voz divina
reclamando da vida reclamando da vida

se dirigindo a mim Deus me pede comida
que eu compre ali no bar pão com sardinha
eu me levanto vou ao bar e volto
(naquele bar não há pão com sardinha)
como voltar a Deus sem levar-Lhe comida?

na lanchonete há salgados e sucos
compro um salgado de carne e um suco de uva
e os levo a Deus esperando comida

Deus contempla o salgado e sabendo-o de carne
me diz que Ele quer um salgado de frango
me levanto de novo e vou à lanchonete
troco o salgado e vou levá-lo a Deus

Deus me sorri um sorriso tão d'Ele
e sôfrego mastiga com Sua fome de Deus

CRIANÇA

quando eu era criança tudo estava certinho
havia os bons e os maus
mocinhos e bandidos
havia certezas na minha alminha de criança

quando eu era criança ainda não havia crepúsculos
havia a noite e havia o dia
durante a noite eu criança dormia
durante o dia ia pra escola e brincava

quando eu era criança havia Deus e o Diabo
o céu e o inferno (o purgatório ao meio)
havia ricos que tinham de ser ricos
havia pobres que tinham de ser pobres
e os do purgatório com medo de ser pobres
uma vontade danada de ser ricos

quando eu era criança havia a vida e a morte
o medo da morte: o desejo da vida
havia virtudes e pecados
tudo no seu lugar quando eu era criança